Patrícia Leuck
O diagnóstico de TDA/TDAH atualmente é um dos
temas mais abordados nos espaços educacionais e clínicos, com conceito bem
específico : criança desatenta, desorganizada e inquieta.
Consta
analisar que a infância e a adolescência são fases de inquietude, de buscas por
respostas, uma verdadeira desorganização de emoções, pensamentos, seguido pelo
sintoma da desatenção. Desatenção do que não está sendo assimilado ou
contextualizado ao seu dia a dia, às suas inquietações. São tantas perguntas e
cobranças do mundo que os cerca, e as respostas? As respostas prontas,
sintetizadas e bem limitadas, tornando-os acomodados, desatentos, hipoativos. Não
os autorizamos a pensar.
Autoria de
pensamento segundo FERNANDÉZ “ é o
processo e a produção de sentidos e de reconhecimento de si mesmo como
protagonista de tal produção”. A
aprendizagem dá-se pela interação, assimilação, associação das ideais. Como
haver tal aprendizagem com crianças enfileiradas em suas cadeiras, apenas
recebendo informações, meros expectadores do mundo que as cerca. SCOZ( 2003)
nos diz que “ ordem e desordem fazem
parte de uma totalidade movente, onde equilíbrio contém e é criado pelo
desequilíbrio, sendo importante para o processo de aprendizagem: ricos em
evoluções imprevistas,traçados de relações não lineares de causa e efeito,
fractados em múltiplas e diferentes magnitudes, tornando-se precária a
universalização.
Não
consideramos a vida cotidiana da criança e do adolescente do século XXI,
Vivemos num mundo globalizado, onde elas captam milhares de conhecimento numa
fração de segundos. A geração Z, geração está que traz características de
assistir televisão enquanto se estuda para uma prova
e fones nos ouvidos ao redigir um trabalho escolar são cenas bem comuns na
atualidade entre os jovens . Convivem com o estresse a ansiedade e
insegurança da sociedade, de sua família, participam ativamente com a
competitividade que seus pais enfrentam lá fora no mercado de trabalho, competição
para serem bem vistos e aceitos em suas tribos, financeiramente, emocionalmente.
E todo esse bombardeio não é nada inofensivo, pois os torna em uma eterna busca
pelo prazer, saciar suas vontades, que muitas vezes nem eles próprios sabem
quais são por não estarem conseguindo
acomodar todas estas informações . Aqui
questiono muito o uso abusivo de medicalização
infantil, e, ao ler a frase de FERNADÉZ quando diz que: " A sociedade
hipercinética e desatenta medica o que produz” nos confirma o que não estamos querendo ver,
ouvir ou até mesmo admitir, admitir que estas crianças estão refletindo o que
estão recebendo: hiperativismo, individualismo e desatenção ao mundo que os cerca, porém exigimos de
nossas crianças totalmente ao contrário.
A sociedade esta aniquilando a infância, podando suas
etapas essenciais para seu desenvolvimento. Queremos filhos e alunos
robotizados, que apenas respondam aos nossos estímulos, evitando a autonomia,
criatividade e criticidade. Criança é corpo, movimento e isso gera agitação,
inquietação, todo este processo resultará na aprendizagem, aprendizagem que
responderá as todos seus questionamentos a cerca de seu mundo. As brincadeiras
onde estão? As interações de lazer familiares estão cada vez mais individualistas
e tecnológicas,
Em estudos na
população francesa Brougère (1993) verificou que os jogos mais utilizados nas
escolas são os pedagógicos e os de atividade motora. O autor ainda constatou
que são os professores que escolhem os materiais e o tempo para a utilização
destes. A brincadeira de faz de- conta apareceu somente nas classes
pré-escolares e a brincadeira livre simplesmente não apareceu. Goldhaber (1994)
traz relatos de professores da educação infantil e constata que a brincadeira
não é vista como um caminho para a aprendizagem. Na Guatemala Cooney (2004)
identificou algumas barreiras que impedem a implementação da brincadeira no
currículo escolar.
Dentre os estudos realizados no Brasil, Wajskop (1996)
pesquisou as concepções dos professores sobre o brincar e verificou que a
brincadeira é vista como diversão e separada da educação.
O brincar é a essência do pensamento lúdico e a
característica das atividades executadas na nossa . E qual a relação entre
brincar e criar? Aqui respondo a estes
questionamentos pertinentes a sociedade atual que é no brincar, e somente no
brincar, que o individuo, criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua
personalidade integral, e é somente sendo criativo que o indivíduo descobre o
seu eu. ( Winnicott, 1975, p. 80)
Atualmente uma discussão psicopedagógica paira onde entre
os educadores não questiona se “o aluno aprende ou não” ou o quanto ele
aprende, mas está voltada a questões mais amplas como : de que modo poderemos
favorecer a aprendizagem?, Que ações pedagógicas adotaremos para facilitar a
construção de conhecimentos?
Veja a afirmação de Albert Einstein ( 1994, p.36) Por
vezes, vemos na escola simplesmente o instrumento para a transmissão de certa
quantidade máxima de conhecimento para a geração em crescimento. Mas isto não é
correto. O conhecimento é morto: a escola, no entanto serve os vivos
O TDA/TDAH é visto como uma desordem
comportamental da infância, inúmeros testes, exames para diagnosticar esta
desordem . Mas que desordem comportamental seria esta ? Ou seria uma
inquietação de saberes ? Julga-se infância, a fase do simbolismo, que unimos
realidade e fantasia, criatividade e imaginação, traquinagens e peraltices de
crianças. Criança precisa ser criança, com sua impulsividade, sua curiosidade
sobre o mundo com seus porquês, suas inquietações . Inquietude é produtividade,
é criação, é vida.
Acredito ser
mais fácil, cômodo delegar esta responsabilidade a uma desordem, distúrbio à
responsabilizar-se pela educação, pelos limites e regras em suas casas e na
rotina dos filhos. Crianças precisam de rotina, limite, focar no seu cotidiano
ou tornar-se-ão adultos insatisfeitos, desajustados, incapazes de organizar sua
própria vida. E, a criança a a partir de brincadeiras, jogos , interações
sociais e principalmente no faz de conta
irá se adequando a estas estruturações sociais, motoras e cognitivas.
As características de crianças
que não possuem limites são descontrole emocional, histerias; distúrbios de
condutas, incapacidade de concentração, excitabilidade, dificuldade para
concluir tarefas e baixo rendimento. Características estas, muito confundidas
com TDAH (hiperatividade).
As crianças atualmente não se
contentam com pouca coisa, exigem muito de professores e pais, querem algo
inovador, que lhes instiguem o intelecto, estamos competindo num páreo duro com
alta tecnologia, e temos que correr, pra não ficar atrás.
Temos
que ter em mente que em uma escola, priorizando a sala de aula temos um grupo
de crianças de uma mesma faixa etária, mas com desenvolvimento emocional,
social e cognitivo bem distintos, cada um com a sua própria dinâmica familiar,
seus próprios valores( em relação a comportamento, limites, disciplina e
autoridade). TIBA utiliza uma expressão bem interessante de que “ O professor pode ser um canhão, mas o aluno
é um revolver”. Quantas situações agressivas e desnecessárias poderemos evitar
se olharmos com outros olhos para nossos alunos, para nós mesmas, porque há
muitos professores e pais hiperativos e
sem limites também. Educamos e ensinamos pelo exemplo. Uma vez uma professora
nos disse em sala de aula “ Meninas vocês serão o espelho de seus alunos, seu
estado de espírito refletirá, muitas vezes neles”.Portanto, a disciplina será
um bem desde que não exista uma moral dupla, que todo mundo aceite e compreenda
as que normas nunca poderão ser iguais a todos, que os alunos as aceite, para o
bem de uma convivência.
PELLEGRINI
afirma que “não nos tornamos competentes socialmente simplesmente porque
professores nos dizem como devemos nos comportar, aprendemos essas habilidades
principalmente na prática, observando exemplos e convivendo com colegas”.
A capacidade
que o ser humano têm em relação a aprendizagem é um fato evidente. Saber
compreender os estágios cognitivos, o funcionamento fisiológico dos alunos
torna-se prioritário no fazer psicopedagógico e educacional. Saber escutar,
questionar a criança, perceber qual entendimento ela possui de sua realidade,
dos valores morais, e da lógica, cria uma habilidade de avaliação rica, capaz
de encaminhar o psicopedagogo ou os educadores para uma conclusão lógica sobre
o potencial de aprendizagem da criança em questão.
Compreender o
processo de pensamento destas crianças e adolescentes é imprescindível,
investigar o seu nível operatório, para que sejam ajustados as propostas de
ensino às suas condições reais de aprendizagem. Instigá-lo e provocar-lhe o
desequilíbrio necessário, lhe possibilitará a reflexão sobre novas formas de
pensar sobre sua realidade, possibilitando assim, o avanço de seu nível
operatório ou de abstração.
Os problemas de aprendizagem
surgem por falta de possibilidade da criança aprender, onde não possui a
curiosidade desperta, não possui autoria de pensamento.
Todo
pensamento, todo comportamento humano remete-nos à sua estruturação inconsciente,
como produção inteligente e, simultaneamente, como produção simbólica.
“A interpretação do discurso não
pode ser feita sem levar em conta o nível da realidade, pois a realidade é a
prova: sem levar em conta a leitura inteligente dessa realidade que lhe dá sua
coerência: sem levar em conta a dimensão do desejo, que é sua aposta, sem levar
em conta sua modalidade simbólica que lhe dará sua paixão”. SARA PAIM (p.233)
Na quarta edição revisada do Manual
Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos
Mentais (DSM-IV-TR) – guia psiquiátrico que contém
informações sobre os mais diversos transtornos mentais estudados e
classificados, publicado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA) –,
estima-se que entre 3% e 5% da população escolar estadunidense seja portadora
do transtorno (APA, 2002).
Em
estudos de caso ao qual me deparei inúmeros são os diagnósticos de TDA/TDAH,
onde pais, professores e psiquiatras relatam os sintomas do transtorno,
autorizando-se a medicalização, que obviamente trará efeitos colaterais que
prejudicarão a vida cotidiana desta criança ou adolescente.
A
necessidade de repensar sobre as rotulações atuais, sobre a medicalização
abusiva para todas situações cabíveis ou não na vida do ser humano torna-se
urgente.
Repensar sobre nossas inquietudes, nossas impulsividades e
agitações são realmente imprescindíveis ao ser humano faltando-nos um embasamento
epistemológico de como devemos conduzir estas características para uma produtividade saudável, criativa e empreendedora, afinal as
melhores produções, as melhores situações de aprendizagem já vistas na
humanidade foram criadas nos mais variados níveis de hiperatividade .
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